Chie Hayakawa, diretora de ‘Plano 75’, diz que seu país está cada vez mais intolerante com os cidadãos frágeis: velhos, deficientes e pessoas em situação de vulnerabilidade social
Por Mariza Tavares
Um programa governamental encoraja os cidadãos a partir dos 75 anos a se submeter à eutanásia. É dessa forma que a diretora Chie Hayakawa apresenta um Japão distópico no filme “Plan 75” (“Plano 75”). “Não se trata de algo tão impossível”, afirmou em entrevista ao jornal “The Guardian”. A obra, que já foi apresentada em mostras de cinema e recebeu um prêmio no Festival de Cannes em 2022, entrou em cartaz no Reino Unido, mas não tem data de estreia no Brasil.
O Japão tem perto de 30% da população composta por idosos e é o país que envelhece mais rapidamente no mundo. A expectativa de vida dos 126 milhões de japoneses é de 85 anos, sendo que, para as mulheres, chega a 87.7 anos (a do homens está em 81). E também vem encolhendo: a taxa de natalidade é de 1.3 filho por casal, abaixo dos 2.1 necessários para manter a população estável. Na ficção, tal cenário leva a uma crise social e econômica que o governo pretende resolver através do extermínio consentido dos velhos.
Apesar de incensado como uma nação que respeita os idosos, a realidade não tem sido tão acolhedora. Recentemente, o primeiro-ministro, Fumio Kishida, afirmou que o envelhecimento da população representa um risco para a sociedade. No filme, os “candidatos” se preocupam em ser um fardo e recebem um bônus para pequenas auto-indulgências no fim da vida, antes de serem submetidos à eutanásia.
A diretora optou por um estilo de documentário: a trama começa com a notícia de um atirador que abriu fogo contra idosos numa instituição de longa de permanência. Na sua opinião, o Japão vem se tornando um país cada vez mais intolerante com seus cidadãos mais frágeis: os velhos, os deficientes, as pessoas em situação de vulnerabilidade social. Ela diz que a “banalidade do mal”, expressão cunhada pela filósofa Hannah Arendt para descrever a política de extermínio nazista, foi uma de suas inspirações: “a burocracia se encarrega de desumanizar tudo”.